Seja você a pessoa certa!

09-07-2011 17:17

 

Casamento

“O sucesso do casamento é muito mais do que encontrar a pessoa certa; é uma questão de ser a pessoa certa.” –B. R. Bricker

 

O elemento mais comum no imaginário amoroso das pessoas do séc. XXI é, talvez, o da “pessoa certa” ou “the one”. Estou cansado de ouvir frases assim: “Ainda não encontrei a pessoa certa” ou “Será ele o cara certo para mim?”. A “pessoa certa” para quem, para o quê? Para o grande “eu”, foco de nossas atenções. Para a importantíssima “minha felicidade”, claro.

A pessoa certa é aquela cujos atributos se acoplam perfeitamente com todos os nossos desejos, hábitos, vícios e peculiaridades. Se sou carente, quero um superprotetor traumatizado (traído da última vez que ficou ausente). Se gosto de vinho, adoraria um homem que seja quase um sommelier. Se sou fascinado por peitos, uma mulher tábua não me serviria.

Tal lógica seria perfeita em um mundo intocado pela impermanência. O problema é que nossas preferências, hábitos e desejos mudam a todo instante. Já tivemos nossas fases gastronômica, carente, acadêmica, cultural, caseira… E assim fomos trocando de parceiros. A situação a que chegamos hoje é simples de resumir: além das relações líquidas, as que tentam ser duradouras dificilmente escapam de situações de traição, adultério e muita, muita dor.

O que aconteceria se invertêssemos essa lógica? Se, em vez de procurarmos pela pessoa certa, tratássemos de ser a pessoa certa? A seguir, vou rascunhar algumas possibilidades nessa outra direção. No entanto, só saberemos se pularmos, mergulharmos e incorporarmos essa outra lógica com nossos poros, retinas, veias. Quem pular nesse abismo, depois passe aqui e nos conte como foi.

A lógica do oferecer

Uma boa metáfora para contrastar as duas abordagens: se estiver em dúvida entre duas pessoas, não escolha a mais engraçada, mas a que ri de suas piadas. Ou seja, não escolha a que tem mais a lhe proporcionar, e sim aquela que mais pode se beneficiar com o que você tem a oferecer.

Em vez de focar suas energias em encontrar alguém belo, contemple seu próprio corpo e faça surgir beleza dele. Em vez de ficar esperando por alguém inteligente, apenas distribua sua inteligência para qualquer um. Seja a pessoa certa, sem esperar resultados ou retribuições de qualquer tipo.

Se você é mulher, não busque olhares. Irradie aquilo que você não precisa de espelhos para ter a existência confirmada. Se é homem, não pense que o amor é aquilo que você recebe. Seu amor é aquilo que você oferece. Isso ninguém tira, isso você leva junto para onde for.

Estava há pouco conversando com um amigo em conflito. Ele deseja vir trabalhar em São Paulo, mas tem uma namorada há 5 anos em sua cidade. Em um dos momentos, disse: “Posso ir a São Paulo, fazer sucesso profissionalmente e nunca encontrar um amor”. Ora, o amor ele trará junto, nunca será encontrado, só direcionado para outra. Se ele cultivar esse amor, é possível que consiga reconquistar a namorada atual quando voltar à cidade natal anos depois. Se ele voltar esperando receber amor, dificilmente conseguirá conquistá-la novamente.

Reconhecendo a impermanência (sem fugir ou ignorá-la), podemos amar com liberdade. Renunciamos a realização de nossos impulsos neuróticos, largamos os ganchos e oferecemos nossas habilidades para o deleite de nosso parceiro. Na verdade, é isso que sempre desejamos, sem saber como realizar.

Após um fim de namoro dolorido, nossa felicidade não surge quando descobrimos que podemos ser amados novamente. Sentimos a vida pulsar apenas quando descobrimos que podemos amar outra pessoa. É a capacidade para o amor que nos alegra. Nossa felicidade não vem do outro tanto quanto vem de nossa própria potência inata de amar e produzir felicidade em todas as direções.

O amor livre como um antídoto ao adultério

Algumas pessoas que já me ouviram falar em “desvincular o amor do amado”, ao propor algo que às vezes chamo de amor livre, reagem com um desconforto e defendem a fidelidade monogâmica – como se “amor livre” significasse poligamia ou justificasse o adultério. Pelo contrário, uma pessoa só trai porque se sente incapaz de reconstruir o amor, curar a relação, sentir-se viva novamente diante do outro e, assim, fazê-lo renascer diferente.

Na verdade, o amor é livre de fixações, livre de personagens, livre até mesmo dos parceiros que os manifestam. Se depender dos condicionamentos que o trazem à tona, ele terminará quando o casal afundar. Mas o amor oferecido não cessa, não é mesmo? Ele é amplo, vasto, todo abrangente. O amor recebido, este sim cessa.

Qual não é nossa surpresa quando percebemos que, logo após o fim, seguimos com a potência de trazer felicidade ao outro? O amor não cessa pois ele é essa abertura ao outro, essa capacidade de oferecer, oferecer, oferecer. Se podemos sempre oferecer, é sinal que sempre temos amor, mesmo quando parece que ele nos foi arrancado de dentro do peito.

Mostro abaixo, ao mesmo tempo que deixo um desafio a homens e mulheres nesse fim de ano, como o amor livre favorece a fidelidade (não o contrário) e diminui o impulso à traição.

Recado para os homens

Faça-me um favor. Descubra logo que você pode conquistar e amar qualquer uma. Seja você rico ou pobre, feio ou bonito, você tem tudo o que é necessário para fazer qualquer mulher feliz. Basta liberar seu amor, sem fixações, hesitações ou dúvidas. Enquanto não perceber que seu amor é livre, você continuará testando-o com várias. Enquanto sentir seu amor acabar, você terá de dormir com outras garotas para resgatar sua potência vital.

Uma vez solto, canalize tudo em apenas uma mulher (a menos que você realmente consiga fazer duas felizes sem causar complicações, o que hoje duvido ser possível em nossa sociedade). Depois, tome cuidado para não confundir foco com fixação. Seu amor nunca será dela para que sempre seja dela, momento a momento, em um processo incessante de escolha e liberdade.

Assim que você vincular seu amor a ela, ele parecerá surgir de fora e você o sentirá como vindo dela para você. É nesse momento que você pára de oferecer, ou seja, pára de amar. Quando a relação acabar, você terá a certeza de que ela levou seu coração, apagou o Sol e deixou a sala vazia, sem amor algum. É esse o outro lado da “pessoa certa”.

Sugestão para as mulheres

De uma vez por todas, sinta-se inteira como sendo o amor que você busca nos olhares e espelhos do mundo. Você já é aquilo que espera ouvir de um homem. Você já está na ilha paradisíaca de seus sonhos, abraçada e acariciada com declarações de amor. No momento em que você sente que precisa de amor, a carência inunda seu corpo até o ponto em que você precisará de outro olhar para voltar a ser bela.

Para você também: seu amor nunca será dele para que seja sempre dele. Enquanto você transpirar amor por todo lado, terá o que oferecer e portanto poderá ser totalmente dele. No instante, porém, que você precisar dele para respirar, você não mais conseguirá oferecer e terá de exigir o amor dele.

Você se lembra dos momentos em que mais foi feliz e aberta? Na maioria deles, havia um outro em cena? Sem querer, vinculamos todas essas sensações a uma ou outra pessoa. Se elas deixarem de proporcionar essas sensações, você será obrigada a buscar um outro que resgate todas as alegrias e toda a beleza que você já vivenciou. Um outro homem que veja beleza em você e movimente tudo aquilo que você desconfia da existência mas não sabe bem como encontrar.

Durante essa busca por amor, você fará muitos homens sofrer. O primeiro vai olhar e revelar beleza. O segundo revelará ainda mais. O terceiro a levará para locais que os dois primeiros nunca sequer vislumbraram. O quarto finalmente a fará mulher. O quinto ensinará todos os prazeres do sexo. O sexto… Até quando? Quando chegará o “The One”? Sinta agora seu corpo, inspire sua beleza, deite-se sobre a certeza de que você já é mulher. Totalmente, inteiramente, deliciosamente mulher. Como a face feminina do amor, ofereça-se ao mundo de corpo e alma. E se ainda quiser causar dor nos homens, produza um outro tipo de dor, if you know what I mean… ;-)

É esse meu desejo para todos os casais. Homens e mulheres completos, um oferecendo ao outro aquilo que nenhum precisa, aquilo que ninguém nunca quis ou pediu (como ensina Contardo Calligaris). Amor necessário é horrível. Amor bom é igual arte: inútil, completamente descartável… e belo.